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O presente artigo traça uma análise sumária e objetiva de alguns aspectos relevantes relacionados ao instituto da reparação por danos morais, hodiernamente, bastante em voga na seara jurídica.

Para tanto, faz-se necessário transcrever, os doutrinários que visam à conceituação do tema cardeal a ser debatido: o dano moral.

No magistério de Yussef Said Cahali (1998), dano moral é:

“tudo aquilo que molesta gravemente a alma humana, ferindo-lhe gravemente os valores fundamentais inerentes à sua personalidade ou reconhecidos pela sociedade em que está integrado”.

No escólio de Carlos Alberto Bittar:

“qualificam-se como morais os danos em razão da esfera da subjetividade, ou do plano valorativo da pessoa na sociedade, em que repercute o fato violador, havendo-se como tais aqueles que atingem os aspectos mais íntimos das personalidade humana (o da intimidade e da consideração pessoal), ou o da própria valoração da pessoa no meio em que vive e atua (o da reputação ou da consideração social)”.

Portanto, o dano moral é a lesão imaterial ou extrapatrimonial que atinge a alma, o íntimo, a paz interior, os direitos personalíssimos do indivíduo, como a vida, a intimidade, a privacidade, a imagem, a honra, etc., que são insuscetíveis de apreciação econômica. Assim, a indenização possui caráter meramente compensatório, como uma forma de amenizar as dores, mas jamais vai reparar integralmente os prejuízos sofridos, restituindo o patrimônio imaterial no estado anterior.

No tocante à matéria de provas o NCPC, por óbvio, mantém a regulamentação do tema, mas alinha o que já existia no diploma anterior com aquilo que já se verificava na prática, garantindo que a atuação das partes se dê de forma conjunta e equilibrada, valorizando o contraditório, assim como na medida do possível, buscando a efetividade e a celeridade processual.

Verifica-se do texto do NCPC que a parte inicial do dispositivo mantém a atual distribuição do ônus probatório entre autor e réu – sendo atribuído ao réu quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, e ao autor quanto ao fato constitutivo de seu próprio direito (art. 373, I e II).

Perante esta regra de distribuição, cada uma das partes já tem conhecimento prévio de qual espécie de fato terá o encargo de provar. No entanto, o NCPC acrescenta nova regra, e a distribuição do ônus deixa de ser estática, na medida em que o § 1º do artigo 373 abre a possibilidade de aplicação da teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova pelo Juiz no caso concreto.

Mas aí vem em mente a seguinte questão e que, sem sombra de dúvidas, é uma das mais discutidas na seara jurídica: na hipótese de dano moral, de que maneira a parte comprovará tal sofrimento?

Apesar de muitos juristas sustentarem que é imprescindível a produção de provas da dor experimentada pela vítima, o dano moral se presume, bastando a prova da lesão.

Assim, eu entendo e defendo que não é necessário que o indivíduo comprove que sofreu ou o que sentiu com determinada situação. A prova efetiva do dano deve ser afastada porque os danos morais não se provam. O que se há de comprovar é a ocorrência de acontecimentos que os ensejaram.

Portanto, não deveria ser necessário provar que sofreu e quanto sofreu, mas somente provar a ocorrência do ilícito e o nexo causal. Assim, provado o fato gerador do dano moral, resta somente quantificá-lo.

Para ratificar o meu posicionamento trago à baila a doutrina de Valdir Florindo (2002, p. 347) :

“ O dano moral emerge in re ipsa das próprias ofensas cometidas. Por se tratar de algo imaterial, ou ideal, não se pode exigir que sua comprovação seja feita pelos mesmos meios utilizados para a demonstração do dano material. Seria uma demasia, algo impossível exigir que a vítima comprovasse a dor, a tristeza, ou a humilhação, através de documentos, atestados médicos, perícia ou com o depoimento de testemunhas. Jamais poderia demonstrar o descrédito, o repúdio, ou desprestígio através de meios probatórios tradicionais”.

Como visto, os prejuízos extrapatrimoniais suportados pela vítima independem de prova material para emergir o direito à reparação moral, bastando a comprovação da prática antijurídica perpetrada pelo ofensor.

A proposição ventilada recebe a chancela do excelso Superior Tribunal de Justiça, consoante denotam os julgados transcritos abaixo:

“Estando comprovado o fato não é preciso a prova do dano moral. (STJ, AGA 250722/SP, j. 19/11/1999, 3ª Turma, r. Carlos Alberto Menezes Direito, DJ 07/02/2000, p. 163)”

“A prova do fato que gerou lesão à reputação da pessoa jurídica é suficiente para a indenização do dano moral. (STJ, REsp. 169030/RJ, j. 22/10/2001, 3ª Turma, r. Ari Pargendler, DJ 04/02/2002, p. 344)”

“Em se tratando de direito à imagem, a obrigação da reparação decorre do próprio uso indevido do direito personalissímo, não havendo que se cogitar de prova da existência de prejuízo ou dano. (STJ, REsp. 45305/SP, j. 02/09/1999, 4ª Turma, r. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ 25/10/1999, p. 83)”

Diante do que a doutrina e a jurisprudência firmaram a respeito, pode-se concluir que não se efetua a prova do dano moral, mas a prova do fato que ensejou o sofrimento à vítima, ou seja, efetua-se a prova do ato ilícito que retirou a paz interior que desfrutava, mas não a prova dos danos evidentes no seu patrimônio imaterial.

Contudo, infelizmente alguns magistrados não coadunam dessa ideia e muitos vezes, apesar das provas contidas no processo, enquadram o fato típico como mero aborrecimento. Muitas vezes, o julgador simplesmente argui a existência do ato ilícito mas não vislumbra qualquer dano. Assim, desconsidera todos os aborrecimentos e frustrações, apenas como MERO ABORRECIMENTO.

Assim, com vertiginosa contumácia, os julgadores tem negado a indenização por danos morais sob o fundamento do “mero dissabor”. Tem entendido as Cortes (orientadas pela posição do Superior Tribunal de Justiça) que nos casos de “mero aborrecimento” não há no que se falar em dano moral. Contudo, pergunta-se: o que é, de fato, “mero dissabor”? Qual a sua natureza? O que justifica a não concessão de indenização nos casos em que o tribunal reconhece a hipótese de “mero dissabor”?

São questões que merecem ser respondidas após uma análise de como os precedentes jurisprudenciais enfrentam a matéria, concomitante a considerações doutrinárias que gravitam em torno do tema.

Concluindo…

Em minha atuação continuou defendendo que se se reconhece a existência de dano moral, seja qual for o grau de violação, a solução jurídica mais acertada será a concessão de indenização. Até porque, num sistema jurídico em que a dignidade humana é levada a sério, quaisquer ofensas, sejam elas em grande, média ou pequena proporção, ensejarão uma indenização proporcional.

Aliás, é essa a lógica do sistema: agride-se muito, paga-se muito, agride-se pouco, paga-se pouco; e não: agride-se pouco, paga-se nada, apesar de sempre se apregoar que a “dignidade humana não consiste em um conceito de aplicação matemática” (SHEREIBER, 2011, p. 8)

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Fonte: Patrícia Teixeira

Referências:

CAHALI, Yussef Said. Dano moral, 2ª ed., São Paulo, Revista dos Tribunais, 1998, p. 20.

FLORINDO, Valdir. Dano Moral e o Direito do Trabalho. São Paulo: LTR, 2002.

SCHREIBER, Anderson. Reparação Não-Pecuniária dos Danos Morais. In: Temas de Responsabilidade Civil, coord. Guilherme Magalhães Martins, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, pp. 1-20.

BITTAR, Carlos Alberto. Reparação civil por danos morais. 4ª ed., rev., aum. e mod. por Eduardo C. B. Bittar. São Paulo: Saraiva, 2015.

BRASIL. Constituição da Republica Federativa do Brasil de 1988: promulgada em 05 de outubro de 1988. Disponível em: civilistica.com || a. 4. n. 2. 2015 || 22 . Acesso em: 12 de agosto de 2017.

PIOVESAN, Flavia. A constituição brasileira de 1988 e os tratados internacionais de proteção dos direitos humanos. Revista jurídica da faculdade de direito Dom Bosco, V. 2, nº 1, pp. 20-33, jan./jun. Curitiba: Dom Bosco, 2008.

RODRIGUES, Francisco Luciano Lima. O fenômeno da constitucionalização do Direito: seus efeitos sobre o Direito Civil. In: Direito Civil Constitucional – a ressignificação da função dos institutos fundamentais do direito civil contemporâneo e suas consequências. Organizadores: Carlos Eduardo Pianovski; Eduardo Nunes de Souza; Joyceane Bezerra de Menezes; Marcos Ehrhardt Junior – Florianópolis: Conceito Editorial, 2014.