Em matéria criminal, não deve ser conhecido recurso especial adesivo interposto pelo Ministério Público veiculando pedido em desfavor do réu.
É consagrado no processo penal o princípio denominado non reformatio in pejus. Por esse princípio, a parte que recorreu não pode ter sua situação agravada no julgamento da insurgência. Trata-se de consequência advinda do princípio da personalidade, pelo qual somente o recorrente pode se beneficiar pelo julgamento, cujos efeitos não aproveitam a parte que não exerceu essa faculdade. A razão é óbvia: todo recorrente almeja ver melhorada sua situação. Se ao invés disso, além de negar provimento ao recurso, pudesse o tribunal, em acréscimo, prejudicar a situação do recorrente, não haveria qualquer incentivo em se recorrer, violando-se, assim, o princípio constitucional da ampla defesa. Além disso, estaria o tribunal agindo de ofício, afrontando o ne procedat judex ex officio e o princípio do tantum devolutum quantum appelatum, pois apreciaria questão (aumento da pena, por exemplo) que não foi objeto de recurso, subvertendo, com isso, o sistema acusatório que orienta nosso sistema.
É por isso que o art. 617 do CPP estabelece expressamente a impossibilidade de se reformar a decisão para pior, em prejuízo do réu, quando somente ele recorreu. Assim, imaginemos a situação em que o réu é condenado, pela prática de um roubo majorado, à pena de quatro anos de reclusão. Não pode o tribunal, ao julgar a apelação do réu, negar provimento ao recurso e, demais disso, aplicar a pena correta que seria, no mínimo, de cinco anos e quatro meses. A única maneira de corrigir o equívoco seria se o Ministério Público tivesse também apelado da sentença no tocante à aplicação da pena. Aí sim, o tribunal negaria provimento ao recurso do réu, mantendo a condenação, e acolheria o recurso do parquet, aplicando a pena correta.
A vedada reformatio in pejus pode ser também indireta, na situação em que a instância superior prejudica o réu não pelo julgamento direto de seu recurso, mas pela adoção de medidas que, por outros meios, podem agravar a situação do agente que havia recorrido. O exemplo mais comum é o da sentença anulada que, proferida novamente, aumenta a pena em relação à decisão anterior.
Recentemente, o STJ julgou mais um caso em que considerou presente a reformatio in pejus indireta: o recurso especial adesivo ao do réu e que veicula pretensão contra ele.
Recurso adesivo é o que depende de interposição do recurso pela parte contrária, pois, como indica a denominação, adere-se a ele.
Não há, no Código de Processo Penal e na Lei nº 8.038/90 – que disciplina as normas procedimentais para os processos nos tribunais superiores –, disposição a respeito da possibilidade de interpor recurso adesivo em recurso especial que trate de matéria penal. No julgamento, todavia, o STJ afirmou em tese essa possibilidade, e o fez referindo-se ao art. 500, inciso II, do revogado CPC (vigente quando interposto o recurso), que, permitindo essa forma de recurso no processo civil, poderia ser aplicado no processo penal porque com este não conflitava.
No entanto, o tribunal considerou que o recurso adesivo ao recurso especial interposto pelo réu, e que veicula pedido em desfavor dele, contraria o disposto no art. 617 do CPP, pois, em virtude “da relação de subordinação, o recurso adesivo ministerial somente poderia ser conhecido caso fosse conhecido também o recurso da defesa, ou seja, a admissão do recurso defensivo acarretaria ao réu um efeito negativo, qual seja, o de que o recurso acusatório adesivo também passaria a ser analisado, caracterizando uma reformatio in pejus indireta”.
Aduziu-se ainda ao fato de que o recurso adesivo é acessório do recurso principal, ou seja, uma vez admitido, passa a compor formalmente este último, ainda que em qualidade secundária. Aplicado esse conceito ao recurso adesivo do recurso especial interposto pelo réu no processo penal, temos a possibilidade de que, admitido este último recurso, a situação do recorrente seja agravada em decorrência de seu próprio ato de insurgência.
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REsp 1.595.636/RN
Fonte: meusitejuridico.com