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Por tempos a temática tributária atrelada a Usucapião tem sido palco de dúvidas por muitos advogados. Com intuito de dirimir esse conflito passo a expor as considerações legais sobre a incidência tributária na usucapião. Afinal, incidirá ITBI ou IPTU em uma ação de Usucapião?

Antes de adentrarmos na temática tributária cumpre esclarecer a natureza Jurídica de uma ação de Usucapião, sendo está, uma aquisição originária da propriedade, que por sua vez é um fato jurídico que permite a aquisição sem qualquer ônus ou gravame. O que se analisa são os requisitos legais para a obtenção de uma propriedade. Na aquisição originária não será mencionada a exigência de retificação de área; eventuais gravames na matrícula originária e etc.

Sendo uma AQUISIÇÃO originária da propriedade já chegamos a uma parcial conclusão de nosso estudo concluindo pela não incidência do ITBI. 

O ITBI, tem como fato gerador a transmissão, inter vivos (entre pessoas vivas), a qualquer título, de propriedade ou domínio útil de bens imóveis; quando há a transmissão a qualquer título de direitos reais sobre imóveis. O contribuinte do imposto é qualquer das partes na operação tributada, como dispuser a lei, que, no caso, será lei municipal.

Na usucapião não temos a transmissão patrimonial de João para Félix, por exemplo. Ocorre uma aquisição de propriedade por João de um imóvel que seja de titularidade de Félix. São situações completamente diferentes. Esse imóvel adquirido por João será livre de seus respectivos ônus, pendências e correlatos derivados da propriedade de Félix. Sempre gosto de chamar a aquisição originária de “aquisição limpa”, livre das anteriores máculas do proprietário.

Primeira regra é que não incide ITBI nas aquisições a título de Usucapião.

Feitas as considerações acima uma pergunta mais profunda é digna de nota. Imagine que o imóvel que João deseja usucapir possui pendências no IPTU. Deverá João quitar esses débitos para obter sucesso na Ação de Usucapião? Se João ganhar essa ação de Usucapião esses débitos tributários continuam a existir? 

Perguntas como essa são bastante comuns quando lidamos com a Usucapião, razão de ser que passo a esclarecer a resolução desses e outros problemas envolvendo a Usucapião e o IPTU.

O Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) possui previsão na Constituição Federal, de competência municipal e do Distrito Federal, cujos contribuintes são as pessoas físicas ou jurídicas que mantêm propriedade, o domínio útil ou a posse de propriedade imóvel localizada em zona ou extensão urbana. O sujeito passivo desse imposto poderá ser o proprietário, bem como o possuidor do imóvel, figura está, palco de nossa discussão.

Dentro de uma ação de Usucapião ainda com Jurisprudência esparsa, sigo o entendimento que o demonstrativo de quitação do IPTU não pode ser considerada uma condição indispensável para sucesso na Ação de Usucapião, haja vista que não existe expressão legal que condicione a procedência da Ação de Usucapião ao pagamento dos montantes referentes ao IPTU. Segue a Jurisprudência pátria:

COMPROVANTE DE PAGAMENTO DE IPTU NÃO É DOCUMENTO INDISPENSÁVEL À USUCAPIÃO. PROVIDÊNCIAS EXTRAJUDICIAIS NÃO CARACTERIZAM OPOSIÇÃO. APELANTE NÃO COMPROVA SUAS ALEGAÇÕES. SENTENÇA DECLARATÓRIA DE USUCAPIÃO MANTIDA. RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 4. Mesmo que o IPTU emitido em 1994 e 1995 em nome do falecido marido da apelada não comprove o recolhimento do imposto, o que efetivamente interessa ao mérito da presente demanda não é a época do pagamento do tributo, mas a situação de estar o imposto referente ao imóvel em nome de membro da família da apelada que com ela residia no imóvel. Tal documento, aliado aos demais elementos probatório dos autos, demonstra a posse da apelada sobre o bem. 5. O comprovante de pagamento de IPTU não é documento indispensável para a usucapião. TJ-CE – Apelação APL 00051222620118060176 CE 0005122-26.2011.8.06.0176 (TJ-CE)

Ementa: Usucapião – Justiça Gratuita – Declaração de Pobreza, em princípio, para a obtenção do benefício, basta a declaração feita pelo próprio interessado de que não pode arcar com as despesas do processo sem prejuízo da própria manutenção ou de sua família – Comprovante de pagamento do IPTU não é documento indispensável para a propositura da demanda – Recurso provido. Agravo de Instrumento AI 22284472420168260000 SP 2228447-24.2016.8.26.0000 (TJ-SP)

Destarte, embora siga o entendimento acima delineado sempre aconselho meus alunos a utilizar da prudência visando evitar recursos desnecessários e morosidade processual. Assim sendo, prefiro verificar junto ao cliente a disponibilidade de fundos para pagamento do IPTU, haja vista que os comprovantes de quitação deste imposto é uma prova extremamente forte da posse mansa e pacífica com animus domini pelo decurso temporal alegado no petitório. O IPTU é o imposto devido por todos aqueles que são “donos de imóveis”, logo se o autor da ação estava na posse com essa qualidade, o mínimo que poderia fazer é prestar a quitação deste imposto.

Se o cliente tem condições financeiras de efetuar o pagamento dos IPTUs atrasados assim o faça, haja vista que é um dos mais importantes meios de prova dessa ação. Caso contrário, embarque nas supracitadas Jurisprudências informando a dispensabilidade do imposto para procedência da ação.

Imagine que nosso amigo João ao adentrar com uma ação de usucapião não apresentou a quitação dos débitos referentes ao IPTU do imóvel que detinha posse há mais de 15 anos. Com o sucesso nessa demanda o imposto deixará de existir e João ficará isento dos débitos passados? A resposta é NÃO. O IPTU É UMA OBRIGAÇÃO PROPTER REM.

As obrigações propter rem são aquelas que perseguem a coisa onde quer que ela esteja, ou seja, tem caráter híbrido por não decorrer da vontade do titular, mas ainda sim da existência da própria coisa. Dessa forma, mesmo com a posterior  aquisição desse imóvel através da Usucapião subsiste a obrigação tributária de pagamento do IPTU que poderá ser perquirido através de uma execução fiscal, haja vista que o IPTU é uma obrigação propter rem. Nesse sentido:

EXECUÇÃO FISCAL. IPTU. USUCAPIÃO. RESPONSABILIDADE POR SUCESSÃO. O pagamento de IPTU configura obrigação tributária propter rem, devida por aquele que detém a propriedade do imóvel, de forma que se reconhece a responsabilidade tributária por sucessão dos novos proprietários usucapientes, nos termos dos arts. 130 e 131 , I , do CTN . APELAÇÃO PROVIDA. (Apelação Cível Nº 70051056695, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: João Barcelos de Souza Junior, Julgado em 28/11/2012). TJ-RS – Apelação Cível AC 70051056695 RS (TJ-RS)

Compreender a tributação no universo da Usucapião é um dos pontos principais para você entender a proposta precípua dessa ação e obter sucesso na seara do Direito Imobiliário.

Autor: Prof. Elyselton Farias do Portal Carreira do Advogado