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A usucapião é modo de aquisição da propriedade (ou seja, não há transferência de domínio ou vinculação entre o predecessor e o usucapiente) e de outros direitos reais pela posse prolongada e qualificada por requisitos estabelecidos em lei. Para que esse direito seja reconhecido emerge como necessário que sejam atendidos os pré-requisitos básicos determinados na lei: O possuidor que quer pedir o usucapião, esteja com intenção de ser dono, explorando o bem sem subordinação a quem quer que seja, com exclusividade, como se proprietário fosse; Que a posse não seja clandestina, precária ou mediante violência; Que seja então, posse de forma mansa, pacífica e contínua pelo respectivo lapso temporal. 

A usucapião possui inúmeras espécies distribuídas no código civil e demais dispositivos normativas brasileiros. Agora, imagine que você pudesse aprender apenas uma espécie de usucapião, qual seria? Meus alunos sabem bem dessa resposta e vou compartilhar com vocês. Seria a Usucapião extraordinária, de longe a mais utilizada na prática advocatícia.

A usucapião extraordinária é aquela que se adquire em 15 (quinze) anos, salvo se o possuidor houver estabelecido no imóvel sua moradia habitual ou nele tiver realizado obras ou serviços de caráter produtivo sendo, nesse caso, o lapso de tempo de 10 (dez) anos, mediante prova de posse mansa e pacífica e ininterrupta, independentemente de justo título e boa-fé, nos termos do artigo 1.238 do Código Civil Brasileiro.

 

Portanto, para que o possuidor do imóvel tenha direito a usucapião extraordinária, são necessários o preenchimento dos seguintes requisitos:

1) Posse com “animus domini” – deve possuir o bem como se fosse seu;

2) Pelo prazo igual ou superior a 15 (quinze) anos;

3) Com posse mansa, pacífica e ininterrupta da propriedade.

Essa modalidade é a forma mais comum de aquisição de propriedade, e tem como característica a inexigibilidade de título (contrato e/ou documento comprobatório) e boa-fé do possuidor. 

Feitos os esclarecimentos acima, imagine a seguinte situação hipotética:

João é possuidor, há mais de 15 anos, de uma área urbana de 10m2. Ele não tem o título de propriedade dessa área, mas afirma ter a posse mansa, pacífica e ininterrupta.

Determinado dia, João procura seu escritório e você ajuíza, em nome do autor, uma ação de usucapião extraordinária pedindo que ele se torne proprietário da área. O juiz julga improcedente o pedido alegando que João preenche os requisitos da usucapião extraordinária previstos no art. 1.238 do CC, porém ele não poderia se tornar proprietário em virtude de o plano diretor da cidade proibir que existam imóveis urbanos registrados com metragem inferior a 20m2.

Em outras palavras, o plano diretor da cidade, para fins de organização e planejamento urbano, fixou que o módulo mínimo dos lotes urbanos naquele Município seria de 20m2 e, como a área ocupada por João seria menor que isso, ele não poderia registrar o imóvel em seu nome.

O STJ em célebre decisão pacificou que se forem preenchidos os requisitos do art. 1238 do CC/2002, a pessoa terá direito à usucapião extraordinária e o fato de o imóvel em questão não atender ao mínimo dos módulos urbanos exigidos pela legislação municipal para a respectiva área (dimensão do lote) não é motivo suficiente para se negar esse direito, pois não há na legislação ordinária própria à disciplina da usucapião regra que especifique área mínima.

Para que seja deferido o direito à usucapião extraordinária basta o preenchimento dos requisitos exigidos pelo Código Civil, de modo que não se pode impor obstáculos, através de leis municipais, para impedir que se aperfeiçoe, em favor de parte interessada, o modo originário de aquisição de propriedade.

O parcelamento do solo e as normas de edificação são providências relativas à função social da cidade. Por outro lado – explicou –, a usucapião tem por objetivo a regularização da posse e, uma vez reconhecida judicialmente, assegura o cumprimento da função social da propriedade.

A função social da cidade não se efetiva de maneira apartada da função social da propriedade. Aliás, certo é que ambos os institutos são membros de um mesmo corpo e que a realização coordenada de ambos sempre promoverá um bem maior.

A usucapião é uma das mais legítimas formas de promoção da função social da propriedade, tendo em vista ser instrumento que prestigia a situação de fato, fato social, qual seja, a boa posse, com repercussão para edificação da cidadania e das necessidades básicas do ser humano.

Assim, o Município pode legislar constituindo “módulo mínimo” para fins de função social da cidade (planejamento e ocupação do solo urbano – art. 30, VIII da CF/1988), porém, essa legislação não pode impedir o nascimento do direito de propriedade através da usucapião, que legitima a função social da propriedade.

 

Prof. do Portal Carreira do Advogado

AUTOR

Elyselton Farias